Para quem acredita que o sucesso das empresas informativas depende de sua capacidade de dar ao público o que ele quer (ou imagina que quer), proponho uma reflexão: quem só vai atrás de supostas demandas do mercado pode conseguir sucesso imediato, mas pode perder prestígio a longo prazo. No setor de informação, a empresa que mais se fortalece é aquela que tem a coragem de mudar, mas, ao mesmo tempo, crê em alguma coisa, tem uma mensagem para transmitir. O verdadeiro crescimento sustentado rejeita o imediatismo suicida do vale-tudo mercadológico. O mercado deve ser um norte, mas não pode ser um tirano. No fundo, a fórmula de um bom produto se resume numa balanceada combinação de tradição e modernidade. Os jornais, sobretudo os que têm história e um patrimônio ético a preservar, não podem atirar-se em aventuras de adolescente. As mudanças, contínuas e necessárias, não devem ferir o código genético do veículo, não podem arranhar sua identidade. Mas, ao mesmo tempo, não há nada mais pernicioso do que a arrogância dos comportamentos imobilistas. É necessário - e é aí que reside a dificuldade - conquistar novos leitores sem perder a fidelidade dos antigos. A empreitada, difícil e fascinante, pressupõe a decisão estratégica de travar uma verdadeira revolução nos conteúdos. A reinvenção dos jornais pede a ousadia do revolucionário e o realismo pragmático de quem sabe que o sucesso de uma publicação depende de sua fina sintonia com as autênticas (e não as aparentes ou supostas) necessidades do mercado. Os recursos humanos são as peças-chave das empresas informativas modernas. O principal fator de diferenciação é a qualificação das pessoas que fazem o produto. A diferença entre dois jornais, duas revistas, duas TVs, não é o suporte tecnológico, mas o talento e a competência dos seus quadros. Por trás do sucesso de jornais como The New York Times, The Wall Street Journal e Finantial Times existem anos e anos de investimentos em formação e treinamento de pessoas. O tempo e o dinheiro gastos em atrair, formar e aperfeiçoar os melhores são um gasto extremamente rentável. O consumidor, cada vez mais crítico e seletivo, cobra qualidade informativa. Por isso, o futuro está perfilando um profissional que saiba pensar com lógica, investigar sem preconceitos, escrever com elegância e informar com clareza e isenção sobre a verdade dos fatos. Impõe-se uma reformulação profunda nos conceitos e na própria operação informativa. A revalorização da reportagem, por exemplo, deve ser uma das prioridades estratégicas. É preciso atrair o leitor com matérias que rompam com a monotonia do jornalismo de registro. Menos oficialismo e mais vida real. Menos aspas e mais apuração. Menos overdose de macro e mais realismo de micro. O leitor quer saber o que acontece na sua cidade, no seu bairro, no seu quarteirão. O consumidor quer saber em que medida o global pode afetar o seu dia-a-dia e, como é lógico, o seu bolso. É isso, e não a repercussão de declarações de políticos, o que os leitores esperam de nós. O que vai agregar estavelmente novos leitores não é a concessão acrítica aos aparentes apelos do mercado. O que vai atrair novas audiências é uma ágil e moderna prestação de serviços, é a informação que não traz o gosto requentado do telejornal da véspera, é a matéria que ultrapassa a superficialidade, é a denúncia fundamentada, é a pauta ousada e criativa. As empresas, no que diz respeito à utilização dos recursos tecnológicos, estarão crescentemente padronizadas. O prestígio dos jornais implica a derrubada de inúmeros tabus: a superficialidade, as imprecisões e a falta de apuração (comodamente atribuídas às pressões do deadline), as omissões e os preconceitos. Só uma revolução nos conteúdos, na ética e na qualidade dos recursos humanos garantirá o crescimento sustentado.
Publicado no OESP, 06/01/2003
*Carlos Alberto Di Franco, diretor do Master em Jornalismo para Editores e professor de Ética Jornalística, é representante da Faculdade de Comunicação da Universidade de Navarra no Brasil. E-mail: difranco@ceu.org.br
|
|
Devido ao padrão da internet a formatação do artigo não segue o padrão original do arquivo. Para visualizar o arquivo original faça o download clicando aqui.
|
|