Ética, já sabemos de que se trata. Há quem saiba mais, quem menos, mas todo ser humano tem sua noção básica. Alguns a levam mais a sério, outros nem tanto como seria desejável.
O conceito original vem do grego “ethos”, que se refere aos “usos e costumes de uma comunidade”.
O objeto material da ética é o ato humano. O objeto formal da ética é a moralidade desse ato. Portanto, como se vê, a ética lida com questões do bem, do direito, da justiça, da honestidade, sinceridade, bem comum etc, e muito mais, mas que, no entanto poderia ser resumida numa palavra chave universal que engloba tudo em si, o Amor.
O amor com sua regra de ouro “faça (ou não faça) aos outros o que gostaria que fizessem (ou não) a ti.
Esta certamente não é uma abordagem completa, mas próxima do aceitável por se tratar de uma colocação rápida.
Uma vez mencionada a ética, qual sua correlação com a Cibernética?
Se você pensa que sabe por intuição o que é Cibernética, acho que seria melhor confirmar sua opinião no texto abaixo, para não haver precipitação do entendimento.
Em primeiro lugar, não é cibern-ética. O fato de ter a mesma terminação é pura coincidência, apenas uma rima po-ética, mas sem poesia.
Desta forma, aqui estou eu, pela enésima vez, tentando explicar em tom meio professoral que Cibernética nada tem a ver com esse negócio de computação eletrônica.
O pai da Cibernética foi Norbert Wiener, um cientista norueguês, que muito provavelmente nem deve ter se dado conta do alcance do seu trabalho e descoberta, tão grande foi a importância dos recentes desdobramentos da sua Ciência nos campos da Sociologia, da Antropologia e até mesmo (talvez principalmente) no campo da Religião, ou seja, da “Fé conforme a Razão”[1].
A Cibernética é uma Ciência fundamentada em alguns Princípios, que por sinal são muito luminosos, do tipo farol alto, que nos faz enxergar muito longe, em dimensões que nem sequer supúnhamos existir.
O primeiro Princípio Cibernético é o da “Unidade e Transcendência”[2] que diz o seguinte: as “partes” que se relacionam em condições de reciprocidade (unidade), podem juntas e relacionadas gerar um novo “todo” (transcendência), que não é a soma ou justaposição das partes, mas um “novo ser”, transcendente portanto, que não existia antes de haver esse relacionamento.
Esse “todo” portanto é superior às partes, porque é mais complexo que as partes que o compõem, é uma “sociedade”, um “todo social”. A condição fundamental para que ocorra um fenômeno Cibernético de transcendência é que de alguma forma haja perfeita unidade. No exemplo clássico, Hidrogênio e Oxigênio morrem (sem morrer) naquilo que são individualmente, para gerar uma nova “comunidade relacional”, a Água, cujas qualidades são totalmente diversas.
Esse novo ser gerado pela experiência de “unidade” entre as partes, unidade esta que somente se realiza quando existe uma perfeita e contínua reciprocidade de relacionamento, é o produto resultante de um fenômeno de Transcendência material, cujas matérias-prima são as partes e sua inter-relação.
Não é um conceito muito complicado, mas a sua importância não tem limites. Basta pensar que todo o Universo material e biológico é uma expressão direta desse Princípio, e sem ele o Universo simplesmente não teria existido, pelo menos assim como ele é hoje.
No instante exato do surgimento do Universo, no Big Bang, a grande explosão, a Energia que estava toda concentrada haveria de se espalhar pelo espaço e se transformar imediatamente em Matéria, deixando de ser um plasma de Quarks e Léptons para se transformar em partículas de Prótons ou Nêutrons e partículas de Elétrons, respectivamente.
Embora existam seis tipos de Quarks e seis Léptons, nenhum deles existe por si só, ou seja, somente existem estavelmente se estivem aos pares em relacionamento recíproco, transcendendo-se ciberneticamente em partículas elementares. Isso significa que não há Matéria sem relacionamento “social”. Se ampliarmos uma laranja até o tamanho da Terra, veríamos um enorme vazio, com átomos em relacionamento, todos do tamanho de uma cereja. E se ampliarmos esse átomo até o tamanho de uma sala, ainda assim não veríamos seu núcleo a olho nu.
Formados então os primeiros átomos, daí em diante a transcendência cibernética não mais se deteve, e como todos sabemos, surgiram diversos tipos de átomos, depois com a relação destes surgiram as moléculas, e destas as células vivas, depois os organismos, os seres vivos, os animais, e dentre eles finalmente nós, os seres humanos, um maravilhoso edifício formado de vazio e complexíssimos relacionamentos progressivos.
São cerca de 15 bilhões de anos de evolução que também não teria acontecido sem a atuação de um Segundo Princípio Cibernético, chamado de Princípio da “Finalidade e Retroação” (ou feed back).[3]
A “Finalidade” é uma causa que não existe ainda, isto é, é uma causa colocada no futuro: Quarks se relacionam para formar prótons. Prótons, nêutrons e elétrons se relacionam para formar átomos. E assim por diante para formar Homens.
Mas o que assegura às partes-em-relação de que elas estão no caminho certo rumo a sua Finalidade? É a Retroação. Ela busca sempre as melhores formas de relacionamento, por tentativas até a otimização suprema do processo, tendo como referência a Finalidade.
A Retroação não é algo periférico neste artigo, porque é exatamente aqui que entra em questão a Ética, vindo assim a completar o círculo do nosso raciocínio.
Assim como é graças à Retroação que conseguimos colocar uma linha no buraco de uma agulha (finalidade), depois de tentativas com erros e acerto, da mesma forma a Retroação colocou veneno nos dentes da serpente que não tem membros para agarrar suas presas. Foi ela que pintou de branco da cor da neve a pele do urso polar para proteger sua vida. Aliás, os fenômenos cibernéticos evolutivos atuam sempre em função da vida, pois como podemos intuir, a Vida faz parte da Finalidade cibernética limite, ou se quisermos, do Ideal Cibernético.
Sendo assim, podemos falar em Cibernética Social, isto é aplicada à sociedade humana. Embora o Homem seja o ápice da evolução é bom que se entenda que isso é verdade até o momento, mas não em definitivo. Caso assim fosse, o Homem seria apenas outro animal em extinção e nada mais, um verdadeiro beco sem saída da evolução.
Seguindo sua vocação cibernética, o Homem, o mais refinado produto cibernético, foi convidado a dar o definitivo passo de transcendência, pois é também ele uma “parte” de um novo “todo social” superior.
Para o Físico, o Big Bang é uma explosão energética. Para o Filósofo talvez seja a explosão da racionalidade. Mas para o místico, aquele que dá a vida por um Ideal, a Criação do Cosmos é uma explosão de Amor. Por nós o Amor transborda sobre de Si mesmo para nos dar a Vida.
São Paulo poderia ser chamado de sábio cibernético quando disse “antes de tudo a mútua e contínua caridade...”. E para os cristãos, o Evangelho é absolutamente cibernético, pois o seu Mandamento, o Novo, é o amor recíproco.[4] Assim nós os cristãos acreditamos que o ápice do Universo “está entre nós”, quando Deus está presente: “onde dois ou mais estiverem unidos em meu nome, ali estarei Eu no meio deles”.
Acima de tudo, o Evangelho tem uma “Finalidade” cibernética explícita, a divinização do ser humano, no “que todos sejam um...”, isto é, a Unidade plena e a Transcendência final.
E a Ética, como se enquadra nesse contexto da Cibernética Social?
Ciberneticamente falando a Ética se posiciona no campo da Retroação.
É a Ética que assegura a evolução rumo à Finalidade.
A Ética é o elemento fundamental de Retroação social, que coloca o relacionamento recíproco pleno como referencial absoluto da evolução humana e social.
A Natureza não tem escolha, ama sempre. O Homem, porém se destaca da Natureza porque tem o dom supremo da Liberdade, e nisso é semelhante ao Criador.
Se ele quiser pode amar, e se amar estará sendo fiel a sua própria natureza evolutiva, fiel a sua constituição cibernética, e assim, pela possibilidade que tem de realizar também ele a experiência de Unidade e Transcendência, levará o Universo a sua máxima expressão, e de volta ao Amor, onde tudo começou, uma evolução-retorno à dimensão Original.
*Marco Antonio Iasi é Empresário, Engenheiro (USP), Administrador e Consultor em Gestão Empresarial. Autor do livro Reengenharia Social (LTR) e em edição Teoria dos Princípios de Gestão.
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