Flavio Farah*
Na reportagem intitulada “Emoções na conta certa”, publicada na edição de ago/2009 da revista Melhor Gestão de Pessoas (pp. 147-149), o psiquiatra Paulo Gaudencio defende que o ser humano precisa expressar suas emoções no ambiente de trabalho, caso contrário adoecerá.
Gaudencio afirma que “é preciso ser muito agressivo no ambiente profissional” mas que “ser agressivo não é bater no chefe”. O psiquiatra sustenta que a dificuldade em compreender o que significa “agressividade saudável” é que se costuma confundi-la com violência.
Para ele, uma das funções da agressividade é colocar limites no espaço vital da pessoa. Ele diz que “Usar a agressividade é não se deixar invadir, não se deixar acuar. A coisa mais agressiva que a pessoa pode fazer, portanto, é dizer: ‘Não vou, não quero, não faço, não pode’. Suavemente”.
Para esclarecer sua tese, Gaudencio usa o seguinte exemplo: “Imagine um barco indo para uma cachoeira. Há três tipos de pessoas: A passiva, a maioria, se deita no barco e se deixa destruir. A agressiva é a que pega o leme e muda a direção do barco. Não fala, faz. O terceiro tipo, muito frequente, chamo de malcriado. Fica em pé no barco. Xingando. Protesta, acha ruim, mas não age, não muda nada. (...)”.
Vejo-me obrigado a contestar Gaudencio porque penso que ele misturou os conceitos e que esse embaralhamento é perigoso, podendo estimular as pessoas a se comportar de forma inaceitável no ambiente de trabalho.
Primeiro, o conceito de agressividade. Agressão é qualquer comportamento cuja finalidade é causar dano a outrem.(1) Assim, a agressão deve ser tida como uma conduta intrinsecamente antiética, salvo se sua finalidade for a auto-defesa. A expressão, “agressividade saudável”, portanto, não pode existir pelo fato de ser intrinsecamente contraditória.
Segundo, o conceito de violência. Segundo o Dicionário Houaiss, violência é a “ação ou efeito de violentar, de empregar força física (contra alguém ou algo) ou intimidação moral contra (alguém)”. No aspecto jurídico, o mesmo dicionário define o termo como o “constrangimento físico ou moral exercido sobre alguém, para obrigá-lo a submeter-se à vontade de outrem; coação”.(2)
A palavra violência significa usar a força ou ameaçar alguém. A diferença é que, no caso da violência, a finalidade do uso da força ou da ameaça não é necessariamente causar dano à vítima. A violência pode ser exercida com a única finalidade de fazer a vítima realizar algo que o violentador deseja.
Agressividade, portanto, tem significado distinto de violência.
Aquilo que Gaudencio conceitua como “agressividade saudável” tem sido definido como assertividade. O termo assertividade origina-se de asserção. Fazer asserções quer dizer afirmar, do latim afirmare, tornar firme, consolidar, confirmar e declarar com firmeza.(3)
Assertividade é o estilo de comunicação por meio do qual as pessoas expressam suas necessidades, seus pensamentos e sentimentos de forma honesta e direta, sem violar os direitos dos outros.(4)
Se assertividade é definida como uma conduta que respeita os direitos alheios, então esse estilo de comunicação é intrinsecamente ético.
No exemplo do barco de Gaudencio, aquele que faz seria o assertivo. O que xinga seria o agressivo.
Talvez de forma inadvertida, Gaudencio embaralhou as noções de agressividade e de assertividade. Esse embaralhamento, infelizmente, prejudica a causa da Ética.
NOTAS
(1) RODRIGUES, Aroldo. Psicologia Social. 7ª ed. Rio de Janeiro: Vozes, 1971. p. 366.
(2) Violência. Disp. em: http://www.serasaexperian.com.br/guiacontraviolencia/violencia.htm .
(3) MARTINS, Vera. Seja Assertivo!: como conseguir mais autoconfiança e firmeza na sua vida profissional e pessoal. Rio de Janeiro: Elsevier. 2005. p. 21.
(4) MARTINS, Vera. Idem. p. 22.
*Flavio Farah é Mestre em Administração de Empresas, professor universitário, articulista, palestrante e autor do livro “Ética na gestão de pessoas”. E-mail: farah@flaviofarah.com.