Site - Qual a importância da ética para o desenvolvimento social, econômico e cultural do país?
Marcos Cintra - Obviamente a questão ética representa um elemento indispensável para que um país possa se desenvolver tanto em termos de geração e distribuição de riquezas como da evolução do ser humano. A conduta ética do poder público, das empresas e do cidadão em geral consiste num elemento cuja solidez faz a diferença entre uma sociedade rica, saudável e culta e outra onde imperam a miséria, a violência e a injustiça social.
Site - O Brasil é a 5ª maior carga tributária e ocupa o 54º lugar em termos de retorno para o cidadão que paga imposto. Como motivar o brasileiro a cumprir sua obrigação de pagar os impostos, quando se constata, que os recursos são mal aplicados ou desviados?
Marcos Cintra - Além da ineficiência na aplicação dos recursos tributários o brasileiro sofre com a alta carga de impostos. O poder público absorve sob a forma de tributos quase 37% de toda a riqueza produzida no país. Para uma economia com renda per capita anual de menos de US$ 3 mil é uma carga muito alta. Países que tributam nos mesmos níveis que o Brasil registram renda de mais US$ 20 mil/ano.
A alta carga de impostos no Brasil cria um sistema injusto, onde a sonegação acaba sendo estimulada como uma forma de sobrevivência por parte dos agentes produtivos. Quem não tem como escapar do Fisco acaba perdendo competitividade, enquanto que quem sonega prospera.
Para reverter esse quadro o Brasil precisa de uma reforma que crie um sistema de impostos universal, automático e de baixo custo para os contribuintes.
Nesse sentido, há no Congresso Nacional a Proposta de Emenda a Constituição 474/01, de minha autoria, que cria o Imposto Único Federal para substituir 11 tributos federais. Sobre toda movimentação financeira seria aplicada uma alíquota de 1,7% (estimativa realizada em 2001) no débito e no crédito de cada operação. Isso faria com que a economia informal também pagasse seus tributos e acabaria com o estímulo à sonegação que impera hoje com tributos declaratórios de alto custo.
Site- A ética na empresa brasileira é utopia ou algo viável?
Marcos Cintra - Este é um tema que o mundo vem debatendo de modo mais intenso nos últimos anos, sobretudo depois dos problemas que vieram à tona envolvendo grandes multinacionais que praticaram fraudes contábeis na Europa e nos Estados Unidos.
Creio que a ética empresarial vem ganhando cada vez mais espaço na economia brasileira. Depois de passarmos por uma fase envolvendo aspectos relacionados a modernização e a competitividade das empresas, observo que aos poucos estamos canalizando maior atenção aos aspectos éticos relacionados ao processo produtivo. Isto tanto é verdade que muitas instituições de ensino no Brasil têm inserido este tema em seus programas curriculares e a demanda por parte dos estudantes é crescente. Atualmente já existem várias empresas que adotam programas relacionados à ética e instituições como a Fundação Fides, a FGV e o Instituto Ethos que lidam de modo extremamente competente com o tema.
Portanto, acredito que a ética na empresas brasileira é algo viável que, gradualmente, irá ganhar peso na tomada de decisão por parte dos administradores, até mesmo porque é um elemento que cada vez mais agrega valor às empresas.
Site - Segundo estudos do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário, mais de um terço (34,47%, em média) do que o brasileiro ganha no ano vai para os cofres do governo em forma de impostos e contribuições. Como pode uma empresa ser competitiva e preservar seus princípios éticos, no relacionamento com as autoridades governamentais?
Marcos Cintra - Sem dúvida que a competitividade empresarial fica comprometida quando tem que disputar mercado tendo que conviver com uma situação onde mais de um terço de toda a riqueza produzida pelos agentes privados é canalizada para os cofres públicos, sendo que essa carga imposta é distribuída de modo muito desigual entre os contribuintes.
Lamentavelmente, sonegar acaba sendo uma questão de sobrevivência na economia brasileira. Isto acaba impondo, de forma compensatória, uma carga muita alta àqueles que não têm como fugir do Fisco.
Manter um sistema ortodoxo baseado em impostos declaratórios e de alto custo irá perpetuar uma situação onde os princípios éticos associados à questão fiscal serão corroídos, gerando cada vê mais injustiça no nosso arcaico sistema tributário.
Nesse sentido, cito o projeto do Imposto Único como fator de grande apelo para se construir um sistema tributário onde todos contribuam a um custo muito baixo que não estimule a corrupção e a sonegação fiscal. É um projeto que restabelece a ética tributária na economia brasileira.
Site - Qual sua opinião a respeito da ética no uso de grampos telefônicos em empresas, no Governo, para se obter vantagens?
Marcos Cintra - É um ato condenável ao qual as empresas e o poder público estão sujeitos. É uma questão cujos alvos precisam se precaver e os responsáveis por esse tipo de crime devem estar sujeitos a leis severas.
*Marcos Cintra Cavalcanti de Albuquerque, 57, é doutor em Economia pela Universidade de Harvard (EUA) e professor-titular e vice-presidente da Fundação Getulio Vargas. É secretário de Finanças do município de São Bernardo do Campo e autor do livro "A Verdade sobre o Imposto Único", Editora LCTE, SP, 2003. Site: www.marcoscintra.org
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